domingo, 30 de setembro de 2018

Śrī Mahākālyaḥ Aṣṭottaraśatanāmāvaḷiḥ - Os 108 nomes da Senhora do Tempo e da Escuridão

Todas as Glórias à Śrī Guru Mahārājācārya Mahāsūrya Paṇḍita Svāmī!
Todas as Glórias à Śrī Mahādeva!
Todas as Glórias à Śrī Bhagavan!
Todas as Glórias à Śrī Śakti Devī!
Todas as Glórias à Śrī Śrī Pārvatī, Śrī Śrī Durgā e Śrī Śrī Mahākālī!


"[...] o Aṣṭottaraśatanāmāvaḷiḥ é um ritual responsável pela manifestação da potência transcendental dos planos superiores em nossa dimensão através de invocações mântricas, geralmente em língua sânscrita.

Trata-se da a recitação dos 108 nomes das Deidades do panteão hindu, em que cada denominação representa um poder/atributo metafísico da Deidade em questão, e que quando pronunciada envolve o ambiente com sua graça divina, sob a égide de uma qualidade específica, que pode estar relacionada com uma bênção acerca da saúde física, um processo de estabilidade emocional, um ato de purificação kármica, e assim por diante."

sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Saudações Acreanas

Saudações acreanas a toda Irmandade Polimata!!!

Saudações polímatas!!!
Diferente dos outros textos publicados, hoje contarei um pouco sobre como está sendo nossa adaptação por aqui! Como está sendo nossa relação com a comunidade local e também com nossa rotina diária de trabalho no projeto Nawa no Acre.
Após completados duas semanas de muito trabalho, muitas conversas e risadas entre nós e também com os moradores locais já me sinto em casa, porem com muitas saudades da família e dos amigos de São Paulo. A chegada do Gabriel Mazzo nosso amigo e irmão de caminhada facilita bem as coisas por aqui – o caboclo é fera bicho, não tem medo do trabalho. Chegou para fortalecer nossa frente de trabalho com muita força, devoção e humildade.
Do mais, está sendo muito tranquilo, apesar do forte calor. Sem internet, televisão, barulho de carro, música alta. Passando na pratica por uma profunda limpeza espiritual e muito estudo. A única coisa que se ouve por aqui são as alvoradas dos galos e dos mais variados espécimes de aves existentes por aqui, um mais lindo do que o outro.

Confiram o que nosso irmão de caminhada tem a nos dizer:

...após quase um ano e meio de muita batalha, trabalho, aprendizados, práticas espirituais, foco e muito amor, enfim cheguei a cidade de Cruzeiro do Sul, no Acre, dando início aos estudos e trabalhos dentro da irmandade Polimata.
Depois de bastante dificuldade pra dar o primeiro passo em terra firme Acreana, fui muito bem recebido pelo nosso Guru Maharaj, ficando algumas horas em nossa casa no centro da cidade, separei alguns pertences e pegamos o rumo para o nosso Templo no interior, onde as obras já estavam sendo realizadas e por aqui estou.
Apenas uma semana, mas já parecem ser anos, uma das coisas que me deixam muito contente nesta vivência, depois de muito trabalho de baixo de sol, poder entrar em meio a mata, caminhar alguns minutos e banhar-se em nosso Igarapé, bem refrescante, ainda que não temos chuveiro, lavar as roupas do dia que são usadas, voltar e estar com sensação de dever cumprido.
A noite aqui chega cedo e o dia mais ainda, tendo algumas horas durante a noite pra realizarmos o que gostamos, no meu caso ler, estudar violão e rezar, e acordar bem cedo pra começarmos os trabalhos manuais.
Por enquanto não temos conexão com o mundo a fora, mas logo isso irá mudar e teremos acesso a internet, o que me deixa mais tranquilo pois o tempo aqui curto, mas a saudade aumenta um pouquinho mais a cada dia, em especial de minha companheira Gabi, que amo demais, sendo que a missão faz com que nos afastemos materialmente por algum tempo de pessoas que mais amamos mas por um motivo maior de uma missão realmente importante para todos.
Algo muito novo pra mim além de estar em meio a floresta amazônica, com árvores enormes, frutos em toda parte, muita simplicidade, dormir em rede, e usar o banheiro fora de casa, são os sonhos, jamais imaginei ter sonhos tão vivos e mirabolantes como os que estou tendo, e muitos, de cinco a seis sonhos por noite e intensos, séries e filmes passam longe de serem tão loucos.
Pra finalizar, estamos realizando mais um lindo trabalho da Irmandade Polimata, desejo a todos uma caminhada com muita paz.
Haribol! [Gabriel Mazzo]

Esse foi o depoimento verdadeiro de quem sempre se mostrou interessado em fazer parte deste grandioso projeto e por coincidência, se é que existe, começamos nossa caminhada dentro do Templo Polimata no mesmo ritual em homenagem ao povo cigano do ano passado (maio de 2017) e hoje estamos aqui cumprindo nossa missão.
Nossa diversão aqui é ver quem é o mais teimoso aqui da casa, se o seu Pedro ou o Francisco. Isso é muito hilário, de verdade gente. Para quem conhece o seu “Trena Coral” sabe do que estou dizendo. Um Pedro é bom, dois, vixi...
Seu Pedro, caboclo velho de guerra com toda sua experiencia nos ensina com paciência, as vezes não né, afinal estamos falando do seu Pedro né! Nos ensina passo a passo do andamento da obra e enquanto executamos nossas tarefas, proseamos num intervalo e outro com muitas histórias e risadas. Mas olha...as vezes até parece ser histórias de pescador, mas vale cada momento.
Nosso irmão Pedro já com seus 60 e tantos anos requer um pouco de atenção de nós. Então fazemos assim... ele diz o que devemos fazer e nós executamos a tarefa, mas como disse anteriormente, o véio é teimoso que só. Então ele trabalha muito também. Seu Pedro coração valente, firme e forte como prego no aço.

Quase todos os dias vamos para casa de uma família de amigos que que fizemos aqui, onde proseamos sem ver o tempo passar regados de um bom café feito num simples fogão a lenha. O casal Aldemiro e sua esposa Antônia, carinhosamente chamada por todos aqui do Ramal 3 de “Tonha” e sua filha, Alana. Família simples e muito batalhadora que nos acolhem e nos fazem sentir em casa apesar da distância de nossa família e amigos.

Nosso querido Gurudeva Mahasurya uma a duas vez por semana vem nos visitar aqui para acompanhar como estamos, se está tudo bem, se precisamos de algo e coisas deste tipo. E claro!!! Acompanhar o andamento da obra, para que ele possa mudar para cá, já que ele tem que ficar em Cruzeiro para cuidar da casa monástica e do material das obras. Essa semana demos um importante passo para obra a qual O deixou muito feliz e que nos deixou felizes e com sentimento de estamos no caminho certo. Mas esse passo ficará em segredo por momento e em breve poderei dar mais detalhes sobre isso. Essa semana recebi uma ótima noticia de nosso mestre e quero aproveitar esse espaço para dizer que estou muito feliz por seu recado Bia e que muito em breve poderemos nos falar mais...
Novas amizades completam, não substituem, a ausência de pessoas queridas como todos do TP Mairiporã, TP Campinas, TP Boituva, Missão Jundiaí e de nossa família.
É pela humanidade que estamos trabalhando arduamente para construção do Templo Polimata aqui no Acre. É por essa obra que renunciamos e a cada pico, uma conquista da Vontade sobre a matéria. Obra que será um monumento  esculpido por esforços valorosos.
Por hoje é isso pessoal!!!
Fiquem todos ligados no blog para as novidades de nosso Templo do Acre.
Meu nome é Gabriel Camargo e estarei trazendo as notícias diretamente de nossa jornada e do templo daqui de Cruzeiro do Sul/AC e do nosso querido Gurudeva Mahasurya.
Minhas mais humildes e sinceras reverências a toda Ordem Polimata.

Minhas mais humildes reverências a Ushanovos, Ioshins, Iripãn e Kokarpinochari.
Todas as Glórias à Sri Mahadeva, Sri Bhagavan e Sri Shakti Devi.  ki...
Todas as Glórias à Sri Guru Maharaj Mahacarya Mahasurya Pandit Swami.  ki....

Fim de Semana mais do que especial no templo,
Satsanga, Feijoada Vegana e a Banda da nossa querida Carol Herrero
A imagem pode conter: 3 pessoas, incluindo Maria Carolina Herrero, atividades ao ar livre
A imagem pode conter: 1 pessoa, em pé, árvore, planta e atividades ao ar livre
A imagem pode conter: 4 pessoas, incluindo Alessandra Simões, Mari Pinheiro e Marcello Wünsche Martins, pessoas sorrindo, pessoas sentadas, criança, bebê e atividades ao ar livre
A imagem pode conter: 1 pessoa, área interna
 

terça-feira, 25 de setembro de 2018

BUSCA DA VISÃO - O MESTRE CONVIDA - DIAS 12, 13 E 14 DE OUTUBRO
 
 
As vagas são limitadas!!!
SAIBA MAIS - www.buscadavisao.com.br/tribos-indigenas
Informações: 11 95610 0029 (Whatsapp)

BUSCA DA VISÃO - ENCONTRO DAS TRIBOS 12,13 e 14 de Outubro Templo Polimata Mairiporã Em outubro, um evento INÉDITO acontecerá em nosso templo: o encontro de duas grandes nações indígenas - os Shawãdawa e os Kaxinawá.

Venha fazer parte de uma experiência imperdível, vivenciando as curas e os ensinamentos de cada tribo com a consagração das Medicinas da Floresta.

Conheça os experientes pajés Shãnã Vande Yuvarrã Pavuracã (Shawãdawa) e Arumuya Ninawa Ukan Baikamaki Kanpunuah (Kaxinawá) participando de atividades culturais, ouvindo suas histórias, interagindo e fazendo parte das rodas de curas guiados por suas canções.


Roda de Miração Especial Noturno

A imagem pode conter: noite e texto
Convidamos à todos os irmãos de medicina à participarem de nossa Roda de Miração Noturna com Ayahuasca, junto a natureza, com o fogo sagrado, a medicina da sananga e do Rapé e também com os cantos nativos e as músicas do nosso querido Victor Veiga. 

Diferente dos rituais tradicionais com Ayahuasca, o foco da Roda de Miração está no exercício visual, no mergulho feito nas mirações que a sagrada medicina nos proporciona.

Guiados pela música, todos os participantes ficam imersos numa egrégora de paz e harmonia que leva a todos muitas vezes a compartilhar da mesma experiência visual.

(VALOR 80,00)
 
Mais Informações em:

quinta-feira, 20 de setembro de 2018






Haux Haux, salve o povo da Arara Shawãdawa!
Nossos agradecimentos ao Pajé Shãnã Vande Yuvarrã Pavuracã e seu filho Dawa Pyãdy, pelos sagrados ensinamentos que trouxeram para nós, dos povos da floresta e da cultura Shawãdawa.

 
Haux Haux, salve o povo da Arara! 
 

Dando inicio ao projeto social do Templo Polimata de Campinas tivemos como primeira atividade uma visita do nossos queridos Shawãdawa Povo Arara  as crianças do Serviço de Convivencia da AMIC.

No intuito de dialogarmos com a comunidade local ( Village) aproveitamos a estadia do Pajé Shãnã Vande Yuvarrã Pavuracã e seu filho Dawa Pyãdy e preparamos uma roda de conversa sobre cultura a indigena, com cantos e historias, levando um pouco da realidade de quem vive em contato direto com a floresta, buscando manter viva sua tradição.

Acreditamos que esse tipo de atividade é fundamental para compor juntamente as crianças uma consciencia de união entre os povos, possibilitando a elas entrarem em contato com as diferentes culturas e comprende-las enquanto manifestação de um todo, prezando pela harmonia e equilibrio.

Agradecemos a equipe da AMIC pela acolhimento.

Nossas mais humildes reverencias.


 

Shawãdawa - Depuikukuty Darãba Nobãkay


 
O Pajé Ancião Shãnã Vande Yuvarrã Pavuracã/Francisco Nogueira ou como gosta de mencionar 'Um estudante' e seu filho e Dawa Pyãdy Shawãdawa/Gabriel Nogueira na beira do igarapé trazendo através dessa canção a força da tradição das medicinas e da força do kaitãna na miração.

Haux Haux

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

ॐ Navarātri - Satsaṅgas à Śrī Durgā e Śrī Mahākālī

Todas as Glórias à Śrī Guru Mahārāja Ācārya Mahāsūrya Paṇḍita Svāmī!
Todas as Glórias à Śrī Mahādeva!
Todas as Glórias à Śrī Bhagavan!
Todas as Glórias à Śrī Śakti Devī!
Todas as Glórias à Śrī Śrī Durgā e à Śrī Śrī Mahākālī!

दसाक्षरिमन्त्र
dasākṣarimantra
 (mantra de dez sílabas para Śrī Cāmuṇḍā, o principal do Navarātri)

ॐ ऐं ह्रीं क्लीं चामुण्डायै विच्चे

om aiṃ hrīṃ klīṃ cāmuṇḍāyai vice

“Reverencio-me Àquela que reúne as Potências e é Mahādevī, Àquela que destrói rapidamente a paixão e a raiva.”

Śrī Durgā e Śrī Kālī.

Neste mês de setembro, nos Templos Polimata de Boituva, Mairiporã e Campinas, celebraremos o esplendoroso Navarātri em nosso Satsaṅga. Trata-se do festival das nove noites (nava, nove; rātri noite, em sânscrito), que simboliza o caminho do aspirante espiritual através da jornada do (auto)conhecimento.

As manifestações femininas são o centro das festividades, uma vez que, de acordo com a tradição hindu, a realização do Absoluto – a suprema consciência desprovida de atributos – se dá a partir do mundo dos atributos – representado pelas deusas, a energia divina da  Consciência Universal.

O desenvolvimento do culto à Devī, o aspecto feminino de Deus, se deu a partir de uma longa transformação de mais de 4.000 anos, através do hinduísmo védico pré-budista – onde os rituais (sacrifícios, austeridades) em si eram mais importantes do que as Deidades – à fase purāṇica pós-budista, quando o processo devocional (bhakti) tornou-se o pilar central da cultura.

Para ilustrar com maior clareza, é importante retratar brevemente o processo de evolução cultural na Índia.
 
Montando o cenário

A ideologia brāhmaṇica tem seu primeiro conjunto de obras escritas entre os séculos XII a IX aC, a partir da compilação do Ṛgveda, um texto śruti(“aquilo que foi ouvido”), fundamentado numa tradição oral muito mais antiga, de um conhecimento revelado pelo divino e transmitido, sucessivamente, de mestre para discípulo.

Adicionalmente, Sāmaveda, Yajurveda e Atharvaveda completam o grupo de manuscritos conhecidos como Vedas, que e envolvem os "deuses védicos", em sua maioria identificados com elementos e fenômenos naturais – como o ar, o fogo e a tempestade, por exemplo –, e apresentam conjuntos de soluções para manusear a realidade sutil a partir de elaborados procedimentos ritualísticos.

Tais obras são absolutamente complexas e fortaleciam o regime de distanciamento da população face aos assuntos religiosos e à vida espiritual, que dependia do intermédio de sacerdotes (brāhmaṇas) para interagir com o divino, baseando-se no ideário sectário do sistema de castas. De certa forma, tal processo é bastante similar à relação de dependência social, espiritual e material estruturada na Europa durante a Idade Média.

Mais adiante, entre os séculos IX a.C. e I d.C., surgem as Upaniṣads (termo que pode ser livremente traduzido como a “doutrina esotérica”), obras que tem por base filosófica a busca pelo Absoluto (ātmanbrahman), realizando a essência comum em todos, independente da posição social, apresentando novos questionamentos e criando novas movimentações no âmbito religioso.

Paralelamente, há o surgimento do budismo, que emerge como alternativa ao exclusivismo do processo brāhmaṇico, convertendo grande porção devaiśyas (casta detentora da riqueza material, representada basicamente por comerciantes e agricultores), que buscavam maior autonomia.

Entre os séculos III e XIII d.C., surgem os Purāṇas (“antigos”, em sânscrito), textos smṛti (elaborados com inspiração divina, mas estruturados pela mente humana; são a base da tradição Smarta) que representam o movimento de retomada do hinduísmo face ao budismo. São manuais que envolvem saúde, ciência, astrologia, religião, e que permitem – ainda que superficialmente –  a inclusão social de outras castas no brāhmaṇismo.

No início da era cristã, os Sūtras (“aforismos”) manifestam-se como um gênero literário que trata de diversos assuntos, e que tem como característica principal a condensação da informação no menor espaço textual possível.
 
Posteriormente, por volta do século V d.C., surge o Tantra, baseado no culto da natureza (śakti), visando a integração do todo, e que desconstrói os conceitos de pureza sectária do brāhmaṇismo, sob a argumentação de que sem compaixão, não há evolução espiritual verdadeira.

Acima, Vedas, Upaniṣads, Purāṇas, Sūtras e Tantra são diferentes gêneros. As ideias presentes em cada gênero fluem em um processo de conexão evolutiva, de amplificação de ideias e conceitos. Portanto, nenhum dos gêneros deve ser menosprezado.

Por fim, devidamente contextualizados, podemos prosseguir fazendo referência à seguinte relação: de um lado, a manifestação masculina de Deus remete à consciência (imanifesto), enquanto sua contraparte feminina, remete à manifestação.

चण्डीपाठः
Caṇḍīpāṭhaḥ, aquela que dilacera pensamentos


Śrī Durgā.
Sobre a aparição primordial de Devī com atributos, destaca-se Śrī Durgā (“inacessível, invencível”), uma vez que a mesma é inicialmente identificada sozinha, e não como consorte de algum outro deus, com papel secundário. Trata-se do retrato de um desejo de emancipação na vida social feminina da sociedade, processo que ocorre dentro dos cultos e das práticas místicas (principalmente tântricas).

Śrī Durgā tem suas origens nos śabaras, uma sociedade não-letrada de agricultores, oriunda de uma área montanhosa no centro da Índia conhecida como Vindhyaśaila, em uma região limiar entre dois reinos, que criava um impedimento de identificação deste povo com outras culturas.

Com a chegada do processo purāṇico de integração à região, Śrī Durgā foi identificada como uma representação de Śakti (potência, força, energia Divina). Tal sincretismo permite que o śabaras se identifiquem com a cultura sânscrita e, em contrapartida, firma a cultura sânscrita como provedora da teologia.

Conforme narrado no Devī Māhātmya, ela é invocada primeiramente sob sua forma universal, Śakti, com o papel central do mito de criação do universo.

Assim, o texto começa narrando a história de um rei que perdeu seus poderes para inimigos e fora abandonado por sua família. Este, eventualmente encontra-se com um brāḥmaṇa, que o questiona, pois mesmo desamparado por todos, filhos, família, funcionários, ainda encontrava-se apegado aos mesmos.

O sacerdote indica que este apego à família é simplesmente fruto do apego ao desejo de retribuição. Assim é, pois dentro do contexto da renúncia, a família é tão passageira como qualquer outra coisa. Então, prossegue inferindo que o rei kṣatriya passa por um processo de ilusão, que é presidido por Mahāmāyā, aquela pelo qual tudo se origina, que atrai as mentes para a ilusão e que também conduz à libertação. É a “soberana do soberano do Universo”.

Ela, através de seu poder entorpecente (tamas), é o que induz Śrī Mahāviṣṇu a dormir sobre as águas de Kāraṇārṇava, o oceano causal (plano que transcende a manifestação material, a realidade última das tradições vaiṣṇavas), processo que precede a emanação do universo material. Porém, Śrī Śakti é também a yoganidrā de Śrī Viṣṇu: o mesmo poder que o adormece é aquele com a capacidade de acordá-lo, para sustentar o universo material.

Então, o brāḥmaṇa relata o episódio referente à invocação da Deusa por Śrī Brahmā (que reside no lótus que brota do umbigo de Kāraṇodakaśāyī Viṣṇu), quando este se vê em apuros face a dois demônios – Madhu (“mel”), que representa o que é doce e gera apego à vida material, e Kaiṭabha (“espinho”), que representa a dor e aversão, que também enredam a alma no saṃsāra (ciclo de nascimentos e mortes).

Os demônios surgem dos ouvidos de Śrī Viṣṇu, enquanto este repousa em Śeṣanāga, a grande serpente, antes mesmo da criação do universo. A partir de lindas oblações, Śrī Brahmā clama à Śrī Ādiśakti (o poder supremo), como a soberana do Universo, para que desperte Śrī Bhagavan (“o venerável”) salvando-o da desgraça, para manifestar o Universo.

Conforme descrito no Devī Māhātmya, versos 54-60, traduzidos por João C. B. Gonçalves.

“Tu és Svāhā! Tu és a oblação! Tu és a exclamação Vaṣat! És a essência da linguagem! Tu és o néctar! Tu estás nos três tempos da sílaba eterna!|54| Mesmo eterna, tu estás no meio tempo, que soa indistintamente. Tu és a própria Sāvitrī, tu és a suprema deusa mãe| Por ti tudo isto se sustenta. Por ti este mundo é criado. Por ti é protegido, ó Deusa, e no final é sempre destruído!|56| Com a forma criadora na origem, com a forma sustentadora na proteção, e com a forma destruidora no final deste mundo, ó mayā do mundo!|57| A grande sabedoria, a mahāmāyā, a grande inteligência, a grande memória, a grande inconsciência, tu és a Grande Deusa, a grande soberana148!|58| Tu és a prakṛti, e tens o poder total sobre os três guṇa. Tu és a noite dos tempos, tu és a grande noite, és a violenta noite da inconsciência!|59| Tu és Śrī, Īśvarī, tu és a modéstia, tu és a consciência caracterizada pela cognição. Tu és a vergonha, tu és a opulência, assim como a alegria, a tranquilidade e a paciência! |60|”

É através deste profundo clamor que a Deusa é colocada como superior à Trimurti (trindade Brahmā-Viṣṇu-Śiva), embasando a tradição Śakta, que coloca Śakti (a Deusa) como a figura central do panteão hindu.

Ela então se manifesta, acordando Śrī Jagannātha (“o Senhor do Universo”, um dos muitos nomes de Śrī Viṣṇu). Este, luta por cinco mil anos com os demônios, enquanto Śrī Mahāmāyā os entorpecia em ilusão. Ludibriados, os demônios se colocam numa falsa posição divina, superior à própria consciência absoluta ali representada por Aquele que tudo permeia (Śrī Viṣṇu) e perguntam-no qual benção Ele deseja. O mesmo responde que sua dádiva é a morte de ambos através de sua providência, finalmente aniquilando-os.

Mais adiante, ainda no Devī Māhātmya, Śrī Devī manifesta-se para combater um novo desequilíbrio dhármico, provocado por Mahiṣāsura, o demônio-búfalo que representa o egoísmo e a ignorância, que derrotou o rei dos devas, o Senhor Indra, e usurpou o controle do plano celestial.

Assim, o Śrī Indra e os demais devas recorreram aos senhores supremos do Universo, a Trimurti, que prontamente invocam Ādi Paraśakti, a Suprema Devī, sob a forma de Śrī Durgā – que recebe então não somente as armas da trindade suprema, como também as aparelhas de Indra, Agni, Varuṇa, Sūrya e Yama e dos demais Devas – deuses do céu, fogo, água, sol e morte, respectivamente. Por fim, é presenteada com um leão por Himavat – a personificação dos Himālayas. Assim, Śrī Durgā desce à Terra e derrota Mahiṣāsura e seu exército após sangrenta batalha.

Subsequentemente, Śrī Durgā é invocada a partir de Śrī Pārvatī (consorte de Śrī Śiva), novamente para enfrentar os asuras (demônios) Śumbha e Niśumbha, que representam, respectivamente, a vaidade e a autodepreciação, e que, devido à prática de severas austeridades, também haviam alcançado grandes poderes, concedidos por Śrī Brahmā.

Devido à sua Suprema beleza de Devī, Śumbha e Niśumbha tentaram conquistá-La. Porém, foram advertidos pela Mesma que Ela só se entregaria a quem pudesse vencê-La em batalha. Os irmãos, tão poderosos, não acreditaram que uma mulher poderia se impor desta maneira e enviaram um exército para trazê-la à força. Sob sua forma colérica, Śrī Caṇḍī, aniquilou a todos pela entoação do bīja (semente mântrica) “ हुं ” (huṃ) e por seu leão.

Enfurecidos, os supremos asuras enviaram dois de seus generais, Cānda e Muṇḍa, que personificam a paixão e a ira, respectivamente. Quando chegaram para enfrentar Śrī Caṇḍī, Esta se enfureceu, proporcionando a manifestação de Śrī Kālī, conforme descrito no Devī Māhātmya:

"Das sobrancelhas de sua testa brotou imediatamente Kālī, com sua face assustadora, carregando espada e laço. Ela portava um estranho bastão coroado por um crânio e tinha uma guirlanda de cabeças humanas, estava envolta em uma pele de tigre, e parecia horrorosa com sua pele macilenta, sua boca escancarada, aterrorizando com sua língua para fora, com olhos afundados e vermelhos, e uma boca que enchia os quatro cantos com rugidos."

Com grande violência e sem qualquer dificuldade, Śrī Kālī decapita Cānda e Muṇḍa, que lhe dá o título de Cāmuṇḍā, elevando-a ao nível de uma mātṛkā(Divina Mãe).

Enfurecidos, Śumbha e Niśumbha decidem por enviar seus serviçais mais poderosos, incluindo o demônio Raktabīja – cujo nome significa “semente de sangue” – , famoso asura que tinha o poder de multiplicar-se para cada gota de sangue sua que tocasse o solo.  Para derrota-lo, Śrī Kālī bebe o sangue das feridas abertas antes que este chegasse ao chão.

Neste momento, os Deuses que assistiam à batalha enviam suas śaktispersonificadas (potências femininas), as aṣṭamātṛkās (oito deusas-mãe):

·      Brāhmaṇī (Śrī Brahmā);
·      Māheśvarī (Śrī Māheśvara, um dos nomes do Senhor Śiva);
·      Ambikā (ou Kaumārī, śakti de Śrī Kārtikeya, deus da guerra);
·      Vaiṣṇavī (Śrī Viṣṇu);
·      Indrāṇī (Indra);
·      Vārāhī (o javali, Śrī Varāha, terceiro avatāra de Śrī Viṣṇu);
·      Cāmuṇḍā (Śrī Kālī, conforme exposta acima, que já se encontrava no campo de batalha);
·      Nṛsiṃhī (Śrī Nṛsiṃha).

Finalmente, Śumbha e Niśumbha decidem enfrentar pessoalmente a situação e partem para a batalha. São aniquilados por Śrī Caṇḍī e o Dharma é restaurado no cosmos.

Assim, Śrī Durgā é um conjunto supremo de qualidades, cujos atributos vêm de diferentes Devas. Eles são partes, Ela é inteira. Assim, não é filha de um deva em específico, mas filha de todos. É ayonija, não-nascida do ventre, sem mãe. Isso a estabelece como Mahādevī, a Deusa dos deuses. É, assim como o Senhor Śiva e o Senhor Viṣṇu, svayambhū (auto-existente).

कृष्णमातृ
Kṛṣṇamātṛ, a mãe escura


Śrī Kālī.


Já o "conceito de Kālī" é mais antigo do que o nome e a figura que conhecemos atualmente. Na região do vale do  já extinto rio Sarasvatī, há registros de um conceito de conflito da dualidade entre o selvagem e o domado há mais de 4.000 anos.

Nos textos védicos, enxergamos referências de 
Śrī Kālī em Nirṛti – "aquela que destrói ṛti”, os ritmos usuais da natureza. É a ancestral deusa escura como carvão e descabelada que personifica o desconforto da humanidade diante da face obscura da Natureza.

Ligada à direção do sul, menos auspiciosa, tradicionalmente identificada com Yama, deus da morte, é indicada como uma das versões “primitivas” de Śrī Kālī, que possui uma representação registrada posteriormente como Dakṣiṇakālī  (que pode ser livremente traduzido como “a que vem do sul”).

Referências sobre Sua origem também foram registradas nas Upaniṣads e relacionam-Na uma das sete línguas de Śrī Agni, deus do fogo, que atua nos campos de cremação.

O Liṅga e o Skanda Purāṇas relatam o episódio em que Śrī Śiva pede pela intervenção de Śrī Pārvatī para matar um demônio, Daruka, que só poderia ser derrotado por uma mulher. Assim, Ela entra no corpo do Senhor Mahādeva, ingerindo um veneno que repousava em sua garganta e transforma-se em Bhadrakālī (literalmente, “Boa Kālī”). Após sua vitória, ainda intoxicada com o veneno e todo o sangue consumido, a Senhora da Escuridão teve de ser acalmada por seu Companheiro, que se coloca sob seus pés, conforme conhecida iconografia.

No śaktismo tântrico, é Ādimahāvidyā, a deidade presidente de um grupo de dez deusas, expansões de sua Natureza Última, e que representam diferentes aspectos da sabedoria divina, Daśamahāvidyā (algo como “as dez faces do grande conhecimento”):

·    Kālī: O Brahman Supremo, nirguṇa (que transcende qualidades e formas), o implacável tempo, que tudo devora;
·      Tārā: aquela que guia através das dificuldades;
·      Tripura Sundarī: a amável senhora dos três mundos;
·      Bhuvaneśvarī: a mãe suprema cujo corpo é o próprio Cosmos;
·      Chhinnamastā: a deusa que se auto-decapita (que alimenta e elimina o ego);
·      Bhairavī: a deusa feroz das muitas formas;
·      Dhūmāvatī: a viúva inauspiciosa, a pobreza personificada;
·      Bagalamukī: paralisadora de inimigos, que detém o poder da palavra;
·      Mātaṅgī: aquela que não possui casta, acessível aos “sujos”;
·      Kamalā: a auspiciosa deusa do lótus – Śrī Lakṣmī.

Daśamahāvidyās. 

Todavia, o mistério de Śrī Kālī simultaneamente transcende e envolve todas as diferentes visões sobre sua origem.

No macrocosmos, Mahākālī é a potência feminina do tempo (kāla), que move o universo manifesto e tudo devora, e que ensina ao sādhaka(caminhante espiritual) que é somente o medo da morte o que o faz mortal. No microcosmos do corpo humano, é kuṇḍalinī śakti, a essência do alento prāṇico que dá vida à matéria, e que conecta o sādhaka à sua verdadeira natureza transcendental.

Como Dakṣiṇakālī, controla a maré de destruição que varre toda a existência, em um ato de puro discernimento divino, e que prepara o terreno para a toda a auspiciosidade trazida pela benevolente Bhadrakālī, aquela que destrói para criar através do Amor Divino, sobre o cadáver (śava) de Śrī Śiva.

A Escura Mãe (“Dark Mother”, como é popularmente conhecida em inglês) é a eterna energia da evolução, cujas ações gradualmente manifestam as possibilidades divinas. Demonstra que as sucessivas mortes são o caminho para a imortalidade, e que sua escuridão é o momento que precede a aurora.

Implacável e destemida, é Cāmuṇḍā, a guerreira invencível, a noite personificada. Sua nudez reflete a própria Natureza em sua essência primordial, livre de qualquer ilusão e apego. É a dissolução da dualidade entre a mais elevada forma de luz, personificando o verdadeiro Dharma, e a mais absoluta escuridão, de onde tudo emana e onde tudo se dissolve.

As cinquenta e duas cabeças em sua guirlanda representam as letras do alfabeto sânscrito, simbolizando sua sabedoria e onipotência, que reside em sua identificação mútua como Parāśakti, a mais elevada potência criativa divina, que manifesta o universo em sua totalidade, e Parāvāk, a mais elevada palavra divina, fonte de toda a linguagem universal.

Seu cinto de braços humanos decepados é o símbolo da ação do karman, pois é ela quem abençoa seus devotos cortando-os do ciclo de nascimentos e mortes. A espada ensanguentada é a força da Compreensão Divina que corta a ignorância (o ego humano distorcido), representada pela cabeça decepada.  As mudrās emanam seus principais atributos, varada (a benevolência) e abhaya (o destemor).

A morada de Śrī Kālī é śmāsana (o campo de cremação), onde ela dança e a manifestação se dissolve. Lá também são dissipados os medos e apegos, a ira, a luxúria, os mais profundos sentimentos que enredam a alma aos grilhões da avidyā (“o conhecimento espiritual equivocado”). Śmāsana está no coração de seu devoto, que lá queima suas limitações e sua ignorância, sob a outorga da Grande Mãe Divina.

Ela se põe sobre o corpo de seu consorte pois sua refulgência coloca-o como o potencial passivo da criação. Śrī Kālikā é ninguém menos do que Śakti, a universal força feminina criadora, ativa. É a letra “i” no nome de Śrī Śiva, o que o diferencia de śava, um corpo sem vida.

Assim, o processo devocional polimata em honra à Śrī Durgā e Śrī Mahākālī reflete a dissolução das dualidades – pois ensinam que a mesma força que destrói e ilude é a potência que constrói e liberta – e a destruição de nossas tendências negativas, onde o triunfo sobre a mente representa a vitória das manifestações divinas face aos demônios da ignorância.

Śrī Śmāsanakālī.

Invocações mântricas para o ritual:

श्रीदुर्गा
śrī durgā

गायत्री  
gāyatrī (métrica de 24 sílabas, usualmente utilizada na invocação das Deidades)

 कत्यायिन्यै विद्महे
कान्यकुमार्यै धीमहि ।
तन्नो दुर्गा प्रचोदयात् ॥


oṃ katyāyinyai vidmahe
kānyakumāryai dhīmahi 
tanno durgā pracodayāt 

“Contemplamos Aquela que é filha da perfeição,
Meditamos na Menina Pura.
Reverenciamo-nos à Inaccessível, para que nos ilumine com sabedoria.”

बीजमन्त्र
bījamantra (contém a sílaba mística raiz da Deidade – para ser repetido 108 vezes na contagem da japamālā)

 दुं दुर्गायै नमः


oṃ duṃ durgāyai namaḥ


Reverencio-me à Inacessível, à Invencível.


श्रीमहाकाली
śrī mahākālī

गायत्री  
gāyatrī

ॐ कालिकायै विद्महे
श्मशानवासिन्यै धीमहि ।
तन्नो काली प्रचोदयात् ॥

oṃ mahā-kālyai ca vidmahe
śmaśāna-vāsinyai ca dhīmahi 
tanno kālī pracodayāt 

“Contemplamos Aquela que é o tempo e a escuridão
Meditamos n’Aquela que reside nos crematórios
Reverenciamo-nos Àquela que possui cor escura / que devora tudo como o tempo, para que nos ilumine com sabedoria.”

दक्षिणकालिका बीजमन्त्र
dakṣiṇakālikā bījamantra

ॐ क्रीं क्रीं क्रीं हूं हूं ह्रीं ह्रीं दक्षिणे कालिके ।
क्रीं क्रीं क्रीं हूं हूं ह्रीं ह्रीं स्वाहा ॥


oṃ krīṃ krīṃ krīm hūṃ hūṃ hrīm hrīm dakṣiṇē kālike
krīṃ krīṃ krīṃ hūṃ hūṃ hrīṃ hrīṃ svāhā


“Aquela que move o corpo sutil à Infinita Perfeição e além, corte-me o ego!
Ofereço minhas oblações à Mãe que dissolve a escuridão através da Potência Divina,  que move o corpo sutil à Infinita Perfeição e além, corte-me o ego!”

Os mantras serão aprofundados em nossa aula de língua sânscrita aplicada ao mantrayoga, que acontece por volta das 20h, antes dos rituais.

Nossos satsaṅgas com Ayahuasca à Śrī Durgā e Śrī Mahākālī acontecem nos próximos sábados, dia 08/09,no Templo Polimata de Boituva, no dia 15/09  no Templo Polimata de Mairiporã, e dia 22/09 no Templo Polimata de Campinas, a partir das 19h.

Siga a programação no Facebook da Agenda Polimata.

Ingressos antecipados no site da Ordem Polimata.

Todas as Glórias à Śrī Guru Mahārāja Ācārya Mahāsūrya Paṇḍita Svāmī!

Todas as Glórias à 
Śrī Śrī Durgā e à Śrī Śrī Mahākālī!

Minhas mais humildes, sinceras e profundas reverências,
                                                                                      
Yuri D. Wolf
सङ्कटमोचन